O que devia ser feito na
Palestina
Palestra de Israel Shamir na
Conferência de Ankara
Queridos amigos turcos e colegas do estrangeiro,
Estou contente por falar de novo convosco, povo da nossa grande vizinha
e ex-soberana Turquia. As vossas últimas evoluções inspiram
optimismo. Vós estais-vos portando bem! A Turquia está ficando
mais forte e mais independente; a obsessão dos vossos chefes em
entrarem na U. E. foi exorcizada. Vós restaurastes o poder do
parlamento, refreastes os excessos militares, aperfeiçoastes a
vossa economia e melhorastes as relações com a Síria e o Irão. A
Turquia já não é uma colónia americana. Vós deixastes de fazer
exercícios da força aérea em conjunto com Israel e os EUA.
Expressastes a vossa manifesta irritação a propósito dos
horrores de Gaza. Agora prestais mais atenção à área onde
viveis; desempenhais um papel importante e estais destinados a
desempenhar um papel ainda mais importante. Muito depende de
vós! Nós sentimo-lo na Palestina cada dia que passa.
Não gastarei o vosso tempo descrevendo os horrores do domínio sionista
na Palestina. Já os conheceis, tende-los visto na TV --
imagens terríveis de escolas queimadas e crianças ardendo em
napalm, do bloqueio de Gaza, dos postos de controlo, das prisões
nocturnas. Faz agora exactamente um ano que houve o ataque a
Gaza, a guerra do último Natal, que foi feita por Israel quando
todo o mundo festejava os seus dias santos. O vosso presidente,
o Sr. Gul, disse há dias ao nosso presidente, o Sr. Peres, que
não visitará Israel enquanto durar o bloqueio a Gaza, e essa é
uma excelente decisão. Na verdade, é urgente levantar o assédio
a Gaza, porque não lhe é permitido receber materiais de
construção para reconstruir as casas destruídas. Mas, pelo
contrário, o assédio israelita a Gaza está a ser reforçado com
a colaboração activa do Egipto. Contudo, para além do problema
de Gaza, temos de olhar para um quadro maior.
Dizem-nos que o problema de Gaza é a intransigência do Hamas, isto é, a
culpa é da própria Gaza. Se apenas Gaza não abraçasse o Islão
radical, Israel poderia acomodar-se às necessidades de Gaza.
Deitemos um olhar para fora de Gaza, para a jóia da Margem
Ocidental, el-Bireh,m a cidade gémea de Ramallah, a sede do
governante aprovado por Israel, Mahmud Abbas. Esta é um cidade
próspera com moradias maravilhosas, com muita vegetação,
automóveis Mercedes ronronantes, e uma linda vista. El-Bireh
decidiu construir um estádio de futebol; pediram dinheiro e
receberam fundos da França, da Alemanha e da FIFA, a Associação
Mundial de Futebol. O estádio foi construído dentro dos limites
urbanos de el-Bireh. Imediatamente, o tribunal de Israel (Israeli
court) decidiu: o estádio deve ser destruído, porque está
dentro do campo de visão de um judeu.
Compreendeis isto? Mahmud Abbas é o mais condescendente líder palestino,
de agora e de sempre; ele faz tudo que Israel quer. A sua
polícia retira-se amavelmente sempre que os jipes israelitas da
segurança entram na cidade para prenderem quem quer que eles
desejem. Ele prende todo o activista que fale contra os excessos
de Israel. Ele até despediu o diplomata palestino mais antigo,
o Dr. Afif Safieh, ex-embaixador em Washington, Londres,
Vaticano e Moscovo, por ele ter falado contra a guerra israelita
em Gaza. Todo o Islamita, todo o apoiante do Islão na Margem
Ocidental está (ou esteve) da prisão de Abbas. Ele é um inimigo
implacável do Islão radical. Não se pode ser mais conciliatório
para com Israel do que Mahmujd Abbas. E, mesmo assim, não lhe é
permitido construir um estádio para os rapazes jogarem à bola na
sua própria cidade, porque os Judeus não deixam.
Portanto, embora Gaza esteja numa situação medonha, o problema não é
apenas Gaza. Islão ou não Islão nem sequer é questão de
ponderar. É indiferente. Islamitas estão na prisão de Abbas,
contudo Abbas nem sequer pode construir um estádio. Um estádio,
não uma madrasa (escola). O membro da Fatah Marwan Barghuti e o
esquerdista chefe da PFLP, Ahmed Sadat, estão nas prisões de
Israel, juntamente com parlamentares da Hamas
O problema é o estado judaico. Não apenas cerca Gaza e destrói um
estádio de futebol em el-Bireh. Estes são problemas locais,
penosos mas locais. O estado judaico foca o poder judaico sobre
todo o mundo. Sem um estado judaico, este poder dispersar-se-ia;
permaneceria local, ficaria caótico, provavelmente ficaria
vencido pelas forças da assimilação. Israel focaliza estas
forças caóticas, concentrando-as para a acção.
Esta acção é contra o Islão. Não somente contra o Islão, mas a
Daru-l-Islam (O Mundo Islâmico) é o primeiro alvo. Nos EUA, os
neocons judaicos conduziram o seu país a uma cruzada contra o
Iraque e o Afeganistão; agora estão tentando o mesmo contra o
Irão. Formaram uma frente poderosa contra o Presidente Obama e
fizeram dele uma figura ridícula depois de ele ter pronunciado
algumas palavras sensatas a respeito da Palestina. Na Europa, se
inspeccionardes os cofres dos grupos neo-nazis e
anti-muçulmanos, encontrareis que eles vivem do apoio judaico.
Na Rússia, os nacionalistas judaicos e sionistas tentam agrupar
os Russos contra os seus irmãos muçulmanos. Por vezes fazem-no a
coberto da Igreja Russa, ou do nacionalismo russo. Escrevi
acerca disto recentemente, quando descobri que as forças mais
anti-muçulmanas na Rússia são organizadas por cripto-sionistas.
Mesmo que um estado palestino fosse estabelecido e reconhecido, ele não
impediria as tentativas israelitas de minar os seus vizinhos, de
bombardear o Irão, de semear discórdia da Rússia à França, da
Turquia à Índia. Os todo-poderosos serviços secretos de Israel
continuariam a intrometer-se. Nem tão pouco neutralizaria as
forças armadas de Israel, e vós sabeis que os generais não
largam facilmente os seus brinquedos, os seus privilégios ou a
sua influência. A máquina militar de Israel é tão poderosa que
ela procuraria exercer o seu poder. Lembrai-vos do tratado de
paz Israel-Egipto: quando foi concluído, a primeira coisa que
Israel fez foi invadir o Líbano.
A má influência do sionismo sobre os Judeus de todo o mundo não se
desvaneceria no caso da “solução dos dois estados”. Em 1920,
Winston Churchill publicou um artigo (Illustrated Sunday
Herald, de 8 de Fevereiro de 1920, pg. 5), intitulado: “
Sionismo ou Bolchevismo” (http://www.library.flawlesslogic.com/ish.htm).
Aí ele fez notar que muitos judeus tendem a abraçar a causa da
igualdade social (para ele era a “impossível igualdade”), e a
melhor maneira de impedir que os por demais poderosos e
dinâmicos judeus de promoverem a igualdade era infectá-los com
sionismo. O seu projecto era apoiado pelo poderoso Império
Britânico e pelo dinheiro dos ricaços judeus anti-igualdade. O
Sionismo venceu. A Igualdade foi derrotada. Se derrotarmos o
sionismo, a igualdade terá outra oportunidade. E a solução dos
dois estados não derrotará o sionismo.
Em resumo, mesmo que o sonho de Mahmud Abbas de uma independência
limitada fosse realizado, isso não seria bom para a região e não
seria bom para o mundo: Israel, na sua forma de estado judaico
supremacista, não pode tornar-se um vizinho pacífico.
O supremacismo conduz à guerra. Somente um estado democrático, sucessor
de Israel e da PNA, poderia viver em paz. Comparai com a África
dos Sul: enquanto foi um estado de supremacia branca, ele foi a
fonte de guerra e perturbação em toda a África. Depois que o
supremacismo foi exorcizado, ele se tornou pacífico. Do mesmo
modo, a Palestina independente seria outro Bantustão do tipo
rejeitado pelos Sul-africanos.
Mas não penso que mesmo esta limitada causa de independência restrita
para a Palestina tenha qualquer possibilidade de sucesso.
Têm-nos dito -- durante 16 anos! – que há um processo de paz
que conduzirá à “solução dos dois estados”. Isto é uma história
da carochinha. Se os Judeus não permitem nem mesmo aos rapazes
do mais leal e obediente El Bireh jogarem futebol, pensais que
eles permitirão que tenham um estado independente? Porquê?
Os Judeus escrevem frequentemente como encaram a independência da
Palestina. (refiro-me agora aos políticos esquerdistas judaicos
mais esclarecidos!). Eles falam de uma Palestina partida em
alguns enclaves, cercados por um muro e arame farpado, com o seu
espaço aéreo e todas as fronteiras controladas por Israel; e a
sua água a permanecer sob controlo judaico. E isto é o melhor em
que eles podem sonhar.
Se quiserdes ter os Dois Estados, isso só poderá acontecer se os Judeus
o quiserem como quiseram em 1947. Assim foi então e assim
voltará a ser apenas se eles sentirem que a alternativa, um
único estado democrático para todos os habitantes da Palestina,
for posta na mesa. É disto que eles têm medo: plena democracia,
plena igualdade em todo o país. Assim mesmo por razões práticas,
devíamos exigir a independência não de bocados ou pedaços
apartados, mas para todo o conjunto: que a Palestina seja unida,
que todos os seus habitantes tenham direitos iguais, e possam
depois poderão discutir constantemente os dois estados. A
primeira coisa é a igualdade, o resto pode esperar.
Falando com franqueza, esta mítica Solução dos Dois Estados não pode ser
encarada. Judeus e Palestinos, todos vivem na Palestina, e não
podem ser fisicamente separados sem um grande tumulto que nos
faria lembrar a Tuirquia e a Grécia de 1921, com os Turcos a
abandonarem Salónica e os Gregos a deixarem Esmirna. Isto é
coisa que não gostaríamos de ver outra vez.
O Ocidente deu a Nansen o seu prémio Nobel da Paz pela transferência de
gregos e turcos. Na minha opinião, isso foi uma calamidade, que
não deve ser repetida. As partições são medonhas; é como serrar
um ser vivo em duas partes. Nem é necessária. Os Gregos e os
Turcos podiam viver juntos como viveram durante quatrocentos
anos; a separação nada de bom lhes trouxe. A separação de
israelitas e palestinos seria má do mesmo modo.
Agora, os sionistas muitas vezes lembram aos Turcos o seu chamado
“problema curdo”. Porém a comparação com o que se passa na
Palestina é falsa, porque os curdos na Turquia têm a cidadania
turca e todos os direitos de qualquer cidadão turco; enquanto os
Palestinos dum modo geral não têm a cidadania do estado de
Israel, nem gozam de quaisquer direitos. Mas num certo sentido
esta comparação está certa: é impossível separar os curdos da
Turquia, porque o povo de origem curda vive desde Diyarbakir até
Istambul. Do mesmo modo, é impossível separar os Palestinos das
populações imigrantes que são chamados “judeus”.
Na verdade, Toda a história da Palestina é uma história de imigrantes
que tomaram um país. Isso acontece: imigrantes da Grã Bretanha
tomaram a América do Norte e a Austrália. É triste, mas
aconteceu. Agora é irrealista esperar que eles regressem a
Inglaterra – não o farão. É errado tentar criar um “estado
independente” para os nativos americanos – tais estados
independentes são chamados “reservas”. A verdadeira solução é a
igualdade para os nativos e os imigrantes, do mesmo modo.
Alguns judeus q1ueixam-se que querem um estado só para eles.
Respondemos-lhes: Vós construístes na areia, e uma casa
construída na areia não pode sustentar-se para sempre. Se
quiserdes um estado só para vós e mais ninguém, ide para um ilha
solitária e desabitada. A Palestina era, e é,
povoada; o melhor que podereis obter nela é serdes cidadãos na
Palestina iguais aos demais.
Falei nesta solução no ano 2001, quando o nosso país estava dilacerado
pela intifada al Aksa. Estava certa então, está certa agora.
Nessa altura, eu disse: não há outra solução se não for a
solução de um só estado. Pessoas, até boas pessoas, activistas,
amigos da Palestina, diziam: não, estamos muito perto da solução
dos dois estados. Eu não acreditei nela então, e não acredito
nela agora. Há apenas uma boa saída, e ela é o caminho da
igualdade e da democracia, do desmantelamento do estado judaico,
forçando-o a dar plenos direitos a todos os palestinos sob o seu
domínio.
Este deve ser o objectivo que devemos procurar alcançar: plena
igualdade e plena integração da Palestina e de Israel, à maneira
da África do Sul. Nada menos.
Isto não significa que não haja nada a fazer até esse momento. A Turquia
pode fazer muito agora, mesmo hoje, para além duma expressão de
solidariedade. O estado judeu é um exemplo horroroso da
injustiça impune. Por exemplo,
|